quinta-feira, 26 de maio de 2022

Geleia Geral


desenho de José César Castro - para o projeto Mostra Visual De Poesia Brasileira - Mário de Andrade - 100 Anos - projeto que idealizamos e foi executado pelo SESC São Paulo - em 1993 - nesse projeto começo a mostrar a minha relação com o Tropicalismo

Geleia Geral – Revirando a Tropicália – Vamos Devorar 22 – 100 Anos Depois

Quando em 1993 criei o projeto Mostra Visual de Poesia Brasileira – Mário de Andrade – 100 Anos – executado pelo SESC – SP na unidade de São Caetano, já tinha ouvido de Caetano, que a Tropicália havia bebido em Oswald, principalmente no seu Manifesto Antropofágico. Daí até criar a ponte da Tropicália com Macunaíma de Mário,  foi uma questão que me veio movida pelo desejo de fazer esse paralelo, não separar Macunaíma, a obra de Mário do tropicalirismo antropofágico proposto por Oswald.

Agora em 2022 – 100 Anos Depois da Semana de Arte Moderna de 1922, quando convidado para escrever uma coluna no Portal Viu! www.portalviu.com.br pelo seu diretor Roberto Barbosa, não pensei duas vezes para dar o nome a coluna de Geleia Geral, mesmo porque essa ideia de devorar 22 a partir da Tropicália já vinha habitando as camadas cinzas do meu crâneo desde 2021.

Quem conhece um pouco do que escrevo sabe que sou fã de carteirinha de Oswald de Andrade, Torquato Neto, Gilberto Gil  e Caetano Veloso. E a Tropicália tem outros personagens tão importantes  quanto eles, para o conceito do movimento, como: o Artista Plástico Hélio Oiticica e o poeta baiano José Carlos Capinam.

clique no link pra ler sobre Helio Oiticica 

http://www.touchofclass.com.br/index.php/2019/03/07/video-helio-oiticica-e-a-tropicalia-tateshots/


Decio Pignatari

Geleia Geral  - Significado

“Geleia geral” é um termo criado por Décio Pignatari. Com ele, o poeta concretista definiu um Brasil que vivia ao mesmo tempo com as novidades que surgiam, especialmente nas artes, no fim da década de 1960 e com as tradições. Era o tropicalismo e o bumba-meu-boi ocupando o mesmo espaço-tempo e se relacionando.

Torquato Neto e Gilberto Gil pegaram esse termo e fizeram a canção-manifesto de mesmo nome, que aparece no disco “Tropicália ou Panis et Circencis”, de 1968. E bem depois, em 1991, Daniela Mercury regravaria a música em seu primeiro trabalho solo, lançado pela Gravadora Eldorado.

A arte está aí, para provar que o poeta nunca morre, só colabora com a geleia geral.

http://www.youtube.com/watch?v=k9jzLktMEm4

Décio Pignatari - 1927-2012


Geleia Geral

Gilberto Gil / Torquato Neto

 O poeta desfolha a bandeira

E a manhã tropical se inicia
Resplendente, cadente, fagueira
Num calor girassol com alegria
Na geleia geral brasileira
Que o Jornal do Brasil anuncia

Ê bumba-iê-iê boi
Ano que vem, mês que foi
Ê bumba-iê-iê-iê
É a mesma dança, meu boi

Ê bumba-iê-iê boi
Ano que vem, mês que foi
Ê bumba-iê-iê-iê
É a mesma dança, meu boi

A alegria é a prova dos nove
E a tristeza é teu porto seguro
Minha terra onde o sol é mais lindo
E Mangueira onde o samba é mais puro
Tumbadora na selva-selvagem
Pindorama, país do futuro

Ê bumba-iê-iê boi
Ano que vem, mês que foi
Ê bumba-iê-iê-iê
É a mesma dança, meu boi

Ê bumba-iê-iê boi
Ano que vem, mês que foi
Ê bumba-iê-iê-iê
É a mesma dança, meu boi

É a mesma dança na sala
(No Canecão), na TV
E quem não dança, não fala
Assiste a tudo e se cala

Não vê no meio da sala
As relíquias do Brasil
Doce mulata malvada
Um LP de Sinatra

Maracujá, mês de abril
Santo barroco baiano
Super poder de paisano
Formiplac e céu de anil

Três destaques da Portela
Carne seca na janela
Alguém que chora por mim
Um carnaval de verdade
Hospitaleira amizade
Brutalidade e jardim

Ê bumba-iê-iê boi
Ano que vem, mês que foi
Ê bumba-iê-iê-iê
É a mesma dança, meu boi

Ê bumba-iê-iê boi
Ano que vem, mês que foi
Ê bumba-iê-iê-iê
É a mesma dança, meu boi

Plurialva, contente e brejeira
Miss-linda Brasil diz: Bom dia
E outra moça também Carolina
Da janela examina a folia
Salve o lindo pendão dos seus olhos
E a saúde que o olhar irradia

Ê bumba-iê-iê boi
Ano que vem, mês que foi
Ê bumba-iê-iê-iê
É a mesma dança, meu boi

Ê bumba-iê-iê boi
Ano que vem, mês que foi
Ê bumba-iê-iê-iê
É a mesma dança, meu boi

O poeta desfolha a bandeira
E eu me sinto melhor colorido
Pego um jato, viajo, arrebento
Com o roteiro do sexto sentido
Voz do morro, pilão de concreto
Tropicália, bandeiras ao vento

Ê bumba-iê-iê boi
Ano que vem, mês que foi
Ê bumba-iê-iê-iê
É a mesma dança, meu boi

Ê bumba-iê-iê boi
Ano que vem, mês que foi
Ê bumba-iê-iê-iê
É a mesma dança, meu boi

Ê bumba-iê-iê boi
Ano que vem, mês que foi
Ê bumba-iê-iê-iê
É a mesma dança, meu boi

Ê bumba-iê-iê boi
Ano que vem, mês que foi
Ê bumba-iê-iê-iê
É a mesma dança, meu boi, ê...

 

Geleia Geral – na voz de Gilberto Gil – faixa do disco Panis Et Circence - 1968

https://www.youtube.com/watch?v=0P6Ut0iqm_U



Fulinaíma MultiPtojetos

www.fulinaimagens.blogspot.com

segunda-feira, 23 de maio de 2022

Cidade em Pauta

 


                Cidade Em Pauta

 Cidade em Pauta - entra no Ar hoje o primeiro programa - um bate papo de Artur Gomes com Roberto Barbosa sobre o lendário Bracutaia e a Biblioteca comunitária inaugurada no último dia 1º de maio.

 Aproveitamos para lembrar que o primeiro Sarau Bracutaico aconteceu no último sábado 21 de maio na Ong Beija Flor - Casa da Solidariedade, com Roda de Capoeira e Maculelê com a garotada do Projeto Beija Flor tendo como instrutores o mestre Levi Cachopa, Levi Miranda e Geiza.

 Tivemos ainda uma palestra sobre empreendedorismo com a coordenadora do Polo de Campos da UNIASSELVI, Ana Mary e uma Roda de Poesia com Artur Gomes, Joilson Bessa, Paulo Roberto Cunha e Roberto Acruche.

 O próximo Sarau Bracutaico será realizado dia 1º de julho, todos e todas já se sintam convidados.


BRIC XXII NO PRELO

 A revista de poesia experimental Bric-a-Brac, volta a circular em junho, com lançamento nacionais a partir de Brasilia.

 Com base na experimentação poética modernista, a Bric que circulou nos anos 80/90, apresentou ao público leitor brasileiro entrevistas históricas e peças literárias surpreendentes , como o poema erótico-pornô “A Cópula” escrito por Manuel Bandeira à maneira de Bocage. Nela também foi publicada a primeira grande entrevista escrita do poeta pantaneiro Manoel de Barros, que passou a fazer parte de suas obras completas.

 Agora, a revista ganhou um novo título e logomarca - BRIC XXII -, em celebração ao centenário de Semana de Arte Moderna de 22. e volta a circular com força total.

 A BRIC XXII está no prelo, terá 110 páginas, cerca de 60 participantes, poetas visuais, experimentais e com poemas escritos com alto teor de críticas sociais.

 Artigos, comentários e entrevistas. Fotografias atuais e de um passado recente.

O destaque fica por conta do artigo “22 e Noigandres”, onde o poeta concreto-paulista Augusto de Campos, aos 91 anos, faz um balanço de suas atividades e dos companheiros do grupo Noigandres -Haroldo de Campos e Décio Pignatari - com os modernistas Mário e Oswald de Andrade.

 Outro destaque inédito: o poema acadêmico Antônio Carlos Secchin abriu sua biblioteca de 20 mil exemplares para mostrar as edicões originais dos 10 livros mais influentes da êpoca da Semana de Arte Modena de SP.

 BRIC XXII foi Editada totalmente em Beagá pelo poeta/jornalista Luis Turiba, pelo ilustrador e programador visual Romulo Garcias e pelo poeta-arquiteto João Diniz, com o luxuoso apoio logístico de Luca Andrade, do Rio de Janeiro.

 A BRIC será lançada em junho no restaurante Beirute-Sul, em Brasilia. Depois, em BH, no espaço cultural Asa de Papel; no Rio de Janeiro na sede da Associação Brasileira de Imprensa (ABI); e em São Paulo, provavelmente na Casa das Rosas, na Avenida Paulista.

 Há convites para lança-la em outras capitais com Recife, Porto Alegre e Salvador.

Obrigado 🙏pelo apoio ao nosso processo de pré-venda

 Luis Turiba, editor


                  poema atávico

 

e se a gente se amasse uma vez só

a tarde ainda arde primavera tanta

nesse outubro quanto

de manhãs tão cinzas

 

nesse momento em Bento Gonçalves

Mauri Menegotto termina

de lapidar mais uma pedra

tem seus olhos no brilho da escultura

confesso tenho andado meio triste

na geografia da distância

 

esse poema atávico tem

a cor da tua pele

a carne sob os lençóis

onde meus dedos

ainda não nasceram

 

algum deus

anda me pregando peças

num lance de dados mallarmaicos

 

comovido

ainda te procuro em palavras aramaicas

e a pele dos meus olhos anda perdida

em teu vestido

 

Artur Gomes

Do livro O Poeta Enquanto Coisa

Editora Penalux – 2020

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sábado, 21 de maio de 2022

Sarau Bracutaico - Hoje

 


É Hoje!

Sarau Bracutaico

Dia 21 de Maio - 16h

Palestra sobre empreendedorismo com Ana Mary, mentora da UNIASSELVI polo de Campos https://portal.uniasselvi.com.br/ -

Roda de Poesia com Artur Gomes, Joilson Bessa,  Adriana Medeiros, Paulo Roberto Cunha  e Roberto Acruche

Ong Beija Flor - Casa da Solidariedade - Barra Velha - Gargaú - São Francisco do Itabapoana-RJ

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https://centrodeartefulinaima.blogspot.com/

 

Artur Gomes

Fulinaíma MultiProjetos

fulinaima@gmail.com

(22)99815-1268 – Whatsapp

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#VIU! 

https://www.portalviu.com.br/arte/geleia-geral-03-antropofagia-oswaldiana-linguagem-metaforica-e-fragmentos-poeticos

 


Geléia Geral – Revirando a Tropicália

Vamos Devorar 22 – 100 Anos Depois

 

Com as bênçãos do deus Dionísio reúno pra Festa das Bacantes: Federika Bezerra, Federika Lispector, EuGênio Mallarmè, Federico Baudelaire, Lady Gumes, Pastor de Andrade, Gigi Mocidade, Rúbia Querubim e Elza Trindade. Tamanha felicidade de reunir numa noite de beijos e vinhos a nata da malandragem da Mocidade Independente de Padre Olivácio – A Escola de Samba Oculta no Inconsciente Coletivo e os seguidores da Igreja Universal do Reino de Zeus e não se assustem porque os pecados são todos meus.

 

Dia 24 de junho a partir das 19h

Geléia Geral – Revirando a Tropicália

Vamos Devorar 22 – 100 Anos Depois

na Santa Paciência Casa Criativa – Rua Barão de Miracema, 81 –Campos dos Goytacazes-RJ





Fulinaimicamente

quarta-feira, 18 de maio de 2022

Artur Gomes - 5 poemas do livro O Poeta Enquanto Coisa

 


Atentado poético

 

a hipocrisia aqui é muita
liberdade muito pouca

com meus dentes

língua/navalha
vou rasgar a tua roupa

para esse poema bomba
explodir na tua boca

 

o

obscuro objeto do desejo

 

de pedra dourada ficaram portas
janelas de entradas e saídas
a sedução de dois olhos
em minha carne proibida
nem tanto pelo o que falo
nem tanto pelo que sinto
a vodka a cereja o conhac
o abismo  o labirinto

 

de pedra dourada
ficou um café orgânico
no teu sertão encantada
numa manhã de domingo
do outro lado da trilha
com tanta veraCidade
que me esqueci da idade
e me apaixonei por tua filha

 

de pedra dourada ficaram
olhos acesos do outro lado a janela
o espelho as contas de vidro
o jogo da sedução a maravilha
os passeios nas cachoeiras
os banhos de bar o carnaval
aquela delícia louca
o batom na minha língua
o cheiro das flores do mal
meu bem-me-quer a tua boca

 

bandeira nacional

 

com palavras
sons
imagens
versos
inauguro o monumento
no planalto central

 

araçá azul
domingo no parque
vapor barato
mal secreto

pérola negra
construção
cabeça Gothan City
poema concreto

 

arte poesia teatro cinema pós poema

terra em transe tropicália grande sertão
veredas vidas secas
memórias do cárcere

 

parangolés
hélio oiticica
artur bispo do rosário
bacurau

seja herói seja marginal

 

Beatriz a Faustino

 

pudesse eu divagar pelos teus poros
bosque do teu reino entre teus pelos
mergulhar contigo o mar da fonte
atravessar da carne a pele a ponte
penetrar no orgasmo dos teus selos

 

pudesse eu cavalgar por tuas crinas
no dorso cavalar onde deflora
deixando assim então de ser menina
e me tornar mulher por toda sina
no inferno céu da tua hora

 

tragédia infame

 

empresto minha voz aos deserdados os desnutridos

os que não tem pela manhã café com pão

e sobre a mesa no almoço nem mesa

nem carne seca com farinha

 

espinha de peixe na garganta

é o que sobrou pra curuminha

 

empresto meu corpo minha voz

a esses personagens

os que tem sede  os que tem  fome

ou os que morrem assassinados

 

 

 

nos guetos  nos campos nas cidades

por balas de fuzil  está fudido o brasil

entregue as traças então me resta

exterminar o nome o sobrenome o apelido

do causador dessa desgraça

 

Artur Gomes

O Poeta Enquanto Coisa

Editora Penalux – 2020

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Fulinaíma MultiProjetos

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segunda-feira, 9 de maio de 2022

Geleia Geral – ReVirando a Tropicália

 


Geleia Geral – ReVirando a Tropicália

performance poética com Artur Gomes acompanhado ao piano por Beth Rocha. No repertório poesias dos seus livros Juras Secretas,  O Poeta Enquanto Coisa e Pátria A(r)mada,  além da homenagem que faz   as  memória dos poetas Torquato Neto e Paulo Leminski com a interpretação de algumas  poesia desses  dois ícones da poesia  brasileira contemporânea.


Roteiro

Veracidade

Jura Secreta 43

 veraCidade 

por quê trancar as portas 
tentar proibir as entradas 
se já habito os teus cinco sentidos 
e as janelas estão escancaradas ? 

um beija flor risca no espaço 
algumas letras de um alfabeto grego 
signo de comunicação indecifrável 
eu tenho fome de terra 
e esse asfalto sob a sola dos meus pés 
agulha nos meus dedos 

quando piso na Augusta 
o poema dá um tapa na cara da Paulista 
flutuar na zona do perigo 
entre o real e o imaginário 
João Guimarães Rosa  Caio Prado

Martins Fontes  um bacanal de ruas tortas 

eu não sou flor que se cheire 
nem mofo de língua morta 
o correto deixei na Cacomanga 
matagal onde nasci 

com os seus dentes de concreto 
São Paulo é quem me devora 
e selvagem devolvo a dentada 
na carne da rua Aurora 

 

Jura Secretas 13

 

o tecido do amor já esgarçamos 
em quantos outubros nos gozamos 
agora que palavro Itaocaras 
e persigo outras ilhas 
na carne crua do teu corpo 
amanheço alfabeto grafitemas 

quantas marés endoidecemos 
e aramaico permaneço doido e lírico 
em tudo mais que me negasse 
flor de lótus flor de cactos flor de lírios 
ou mesmo sexo sendo flor ou faca fosse 
Hilda Hilst quando então se me amasse 

ardendo em nós salgado mar e Olga risse 
pulsando em nós flechas de fogo se existisse 
por onde quer que eu te cantasse ou Amavisse 

 

Jura Secreta 14

 

eu te desejo flores lírios brancos 
margaridas girassóis rosas vermelhas 
e tudo quanto pétala 
asas estrelas borboletas 
alecrim bem-me-quer e alfazema 

eu te desejo emblema 
deste poema desvairado 
com teu cheiro teu perfume 
teu sabor teu suor tua doçura 

e na mais santa loucura 
declarar-te amor até os ossos 

eu te desejo e posso : 
palavrArte até a morte 
enquanto a vida nos procura 

 

Jura Secreta 16

para may pasquetti 

fosse esta menina Monalisa 
ou se não fosse apenas brisa 
diante da menina dos meus olhos 
com esse mar azul nos olhos teus 

não sei se MichelÂngelo 
Da Vinci Dalí ou Portinari

 te anteviram 
no instante maior da criação 

pintura de um arquiteto grego 
quem sabe até filha de Zeus 

e eu Narciso amante dos espelhos 
procuro um espelho em minha face 
para ver se os teus olhos 
já estão dentro dos meus 

 

Jura Secreta 18

 

te beijo vestida de nua
somente a lua te espelha
nesta lagoa vermelha
porto alegre caís do porto
barcos navios no teu corpo

os peixes brincam no teu cio
nus teus seios minhas mãos
as rendas finas  que vestias
sobre os teus pêlos ficção

 

todos os laços dos tecidos
aquela cor do teu vestido
a pura pele agora é roupa
o sabor da tua língua
o batom da tua boca
tudo antes só promessa
agora hóstia entre os meus dentes

 

e para espanto dos decentes
te levo ao ato consagrado
se te despir for só pecado
é só pecar que me interessa

 

Jura secreta 29

 esfinge 

o amor 
não é apenas um nome 
que anda por sobre a pele 
um dia falo letra por letra 
no outro calo fome por fome 
é que a pele do teu nome 
consome a flor da minha pele 

cravado espinho na chaga 
como marca cicatriz 
eu sou ator ela esfinge: 
Clarice/Beatriz: 

assim vivemos cantando 
fingindo que somos decentes 
para esconder o sagrado 
em nossos profanos segredos 
se um dia falta coragem 
a noite sobra do medo 

é que na sombra da tatuagem 
sinal enfim permanente 
ficou pregando uma peça 
em nosso passado presente 

o nome tem seus mistérios que 
se escondem sob panos 
o sol é claro quando não chove 
o sal é bom quando de leve 
para adoçar desenganos 
na língua na boca na neve 

o mar que vai e vem não tem volta 
o amor é a coisa mais torta 
que mora lá dentro de mim 
teu céu da boca é a porta 
onde o poema não tem fim 

 

Jura Secreta 45 

fulinaimagem

1

 

por enquanto 
vou te amar assim em segredo 
como se o sagrado fosse 
o maior dos pecados originais 

e minha língua fosse 
só furor dos Canibais 

e essa lua mansa fosse faca 
a afiar os versos que inda não fiz 
e as brigas de amor que nunca quis 

mesmo quando o projeto 
aponta outra direção embaixo do nariz 
e é mais concreto 
que a argamassa do abstrato 

por enquanto vou te amar assim 
admirando teu retrato 
enquanto penso minha idade 
e o que trago da cidade 
embaixo as solas dos sapatos 

2

o que trago 
embaixo as solas dos sapatos é fato 
bagana acesa 
sobra  do cigarro é sarro 

dentro do carro

ainda ouço Jimmi Hendrix 
quando quero 
dancei bolero

 sampleAndo rock and roll 

prá colher lírios 
há que se por o pé na lama 
a seda pura foto-síntese do papel 
tem Flor de Lótus nos bordéis Copacabana 
procuro um mix da guitarra de Santanna 
com os espinhos da Rosa de Noel 

 

Jura Secreta 48 

sagarínica  fulinaimânica 

não sou iluminista nem pretender 
eu quero o cravo e a rosa 
cumer o verso e a prosa 
devorar a lírica a métrica 
a carne da musa 
seja branca negra amarela 
vermelha verde ou cafuza 

eu sou do mato 
curupira carrapato 
sou da febre sou dos ossos 
sou da Lira do Delírio 
São Virgílio é o meu sócio 

Pernambuco Amaralina 
vida breve ou sempre vida/severina 
sendo mulher ou só menina 
que sendo santa prostituta 
ou cafetina devorar é minha sina 
e profanar é o meu negócio 

 

Artur Gomes

do livro Juras Secretas

Editora Penalux – 2018

www.secretasjuras.blogspot.com


Inventário

 come vento menina

come vento

não há mais metafísica no mundo

do que comer vento

tem de todas os sabores

amargo meio amargo

chocolate com café

sabe como é que  é

em meio a tanta crise

a gente inventa o vento que se quer

 

A poesia pulsa

Para Tanussi Cardoso

 Aqui a poesia pulsa na veia no vinho no peito

no pulso na pele nos nervos nos músculos

nos ossos posso falar o que sinto posso sentir o que posso

 aqui a poesia pulsa nas coisas nos códigos nos signos os significantes os significados

aqui a poesia pulsa na pele da minha blusa

na íris dos olhos da minha musa toda vez que ela me usa nas iguarias de Bento quando trampo mais não troco quando troco mas não trapo

 nas pipas nos vinhedos nos arcos nas madrugadas dos bares sampleando  bolero in blues rasgado  num guardanapo

o poema pra Juliana escrito na cama do quarto no copo de vinho na boca de Vênus na bola da vez da sinuca sangrada pelo meu taco

aqui a poesia pulsa nos cabelos brancos da barba nas gargalhadas de Bacca na divina língua de Baco

 

Afiando a Carnavalha

1

cocada agora só se for de coco

paçoca de amendoim

cigarro só se for de palha

cacique só se for da mata

linguagem só tupiniquim

bala agora só se for de prata

água só se aguardente

tônica só se for com gim

estado só se for de surto

eleição só se for sem furto

brilho só no camarim

golaço só se for de letra

Ronaldo só se for Werneck

malando só se mandarim

política só se for decente

partido só sem presidente

governo eu que mando em mim

batismo só se for de pia

congresso só de poesia

Reinaldo pode ser Valinho

ainda melhor se for Jardim

2

Roberta só se for Cainelli

Bruna agora só se for Poletto

vestido pode ser a própria pele

que cobre a nudez do esqueleto

Camila só se for Pitanga

carnaval só se for sem tanga

se houver tempo a gente transa no coreto

Juliana só se for Estefani

Paola só se Oliveira

Florbela se me quiser me espanca

e a gente trampa nos quintais da goiabeira

 

Artur Gomes

O Poeta Enquanto Coisa

Editora Penalux – 2020

www.fulinaimicamente.blogspot.com



fome

 come osso menina come osso menino

não há mais metafísica no mundo do que comer osso

 no açougue ou no mercado osso de graça já foi dado hoje é vendido hoje é comprado

 come osso maria  come osso mané come osso joão com arroz e feijão quebrado

 porque nesse país sem nome temos que comer osso para matar a nossa fome

 

 já podeis

da pátria, filho

ver demente

a mãe gentil

 

já raiou

a liberdade

em cada cano de fuzil

 

salve lindo

fuzil que balança

entre as pernas

a(r)madas da paz

 

a  gripezinha

era a certeza esperança

de um genocida

imbecil incapaz

 

 navegar é preciso

           para Fernando Aguiar

 

Aqui redes em pânico

pescam esqueletos no mar

esquadras  descobrimento

espinhas de peixe convento

cabrálias esperas relento

escamas secas no prato

e um cheiro podre no AR

caranguejos explodem

mangues em pólvora

 

é surreal a nossa realidade

tubarões famintos devoram cadáveres

em nossa sala de jantar

 

como levar o   barco

em meio a essa tempestade

navegar é preciso

mas está dificilíssimo navegar 

 

 

Deus não joga dados

mas a gente lança

sem nem mesmo saber

se alcança

o número que se quer

 

mas como me disse mallarmè

:

- vida não é lance de dedos

A vida é lança de dardos

Deus não arde no fogo

                   mas eu ardo

 

Tecidos sobre a Terra

Terra, antes que alguém morra escrevo prevendo a morte arriscando a vida antes que seja tarde e que a língua da minha boca não cubra mais tua ferida

entre aberto em teus ofícios é que meu peito de poetasangra ao corte das navalhas e minha veia mais aberta é mais um rio que se espalha

amada de muitos sonhos e pouco sexo deposito a minha boca no teu cio e uma semente fértil
nos teus seios como um rio

o que me dói é ver-te devorada por estranhos olhos e deter impulsos por fidelidade

ó terra incestuosa de prazer e gestos não me prendo ao laço dos teus comandantes só me enterro à fundo nos teus vagabundos com um prazer de fera e um punhal diamante

minha terra é de senzalas tantas enterra em ti milhões de outras esperanças soterra em teus grilhões a voz que tenta – avança
plantada em ti como canavial que a foice corta
mas cravado em ti me ponho a luta mesmo sabendo – o vão estreito em cada porta

 

 MOENDA

usina
mói a cana
o caldo e o bagaço

usina
mói o braço
a carne o osso

usina
mói o sangue
a fruta e o caroço

tritura suga torce
dos pés até o pescoço

e do alto da casa grande
os donos do engenho controlam

:

o saldo e o lucro

 

terra de santa cruz



I

ao batizarem-te
deram-te o nome:
posto que a tua profissão
é abrir-te em camas
dar-te em ferro
ouro
prata
rios
peixes
minas
mata
deixar que os abutres
devorem-te na carne
o derradeiro verme

 

II

salgado mar de fezes
batendo nas muralhas
do meu sangue confidente
quem botou o branco
na bandeira de alfenas
na certa se esqueceu
das orações dos penitentes
e da corda que estraçalha
com os culhões de Tiradentes

III

salve lindo pendão que balança
entre as pernas abertas da paz
tua nobre sifilítica herança
dos rendez-vous de impérios atrás

 

IV

meu coração
é tão hipócrita que não janta
e mais imbecil que ainda canta:
ou
viram

no Ipiranga

às margens plácidas
uma bandeira arriada
num país que não levanta



V

só desfraldando

a bandeira tropicalha
é que a gente avacalha
com as chaves dos mistérios

dessa terra tão servil
tirania sacanagem safadeza
tudo rima uma beleza

com a pátria mãe que nos pariu

 

1º de Abril

 

telefonaram-me

avisando-me que vinhas

na noite uma estrela

ainda brigava contra a escuridão

na rua sob patas

tombavam homens indefesos

esperei-te 20 anos

até hoje não vieste à minha porta

 

 

telefonaram-me
avisando-me que vinhas
na noite uma estrela
ainda brigava contra a escuridão
na rua sob patas
tombavam homens indefesos
esperei-te 20 anos
até hoje não vieste à minha porta

 

 

VI

o poeta estraçalha a bandeira
raia o sol marginal quarta feira
na Geléia Geral brasileira
o céu de abril não é de anil
nem general é my Brazyl


minha verde/amarela esperança
Portugal já vendeu para França
e coração latino balança
entre o mar do dólar do norte
e o chão dos cruzeiros do sul

VII

o poeta esfrangalha a bandeira
raia o sol marginal sexta feira
nesta porra estrangeira e azul
que há muito índio dizia:


meu coração marçal tupã
sangra tupy & rock and roll
meu sangue tupiniquim
em corpo tupinambá
samba jongo maculelê
maracatu boi bumbá
a veia de curumim
é coca cola & guaraná

VIII

o sangue rola no parque
o sonho ralo no tanque
nada a ver com tipo dark
e muito menos com punk
meu vício letal é baiafro
com ódio mortal de yank


IX

ó baby a coisa por aqui

não mudou nada
embora sejam outras

siglas no emblema
espada continua a ser espada
poema continua a ser poema

 

Artur Gomes

Pátria A(r)mada

Editora Desconcertos – 2019




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Artur Gomes - O Homem Com A Flor Na Boca

  metafórica dialética quantas teorias terei para escrever o que falo?   quantos sapatos ainda apertam os calcanhares do meu calo?...