domingo, 25 de setembro de 2022

Mostra Visual De Poesia Brasileira - Poesia Em Movimento

 




no mangue

 a fauna sangra

a flora implora


qualquer palavra eu invento

na carnadura dos ossos

na escriDura do éter

na concretude do vento

na engrenagem da sílaba

vocabulário onde posso

dar nome próprio ao veneno

que tem o Agro Negócio


SagaraNAgens Fulinaímicas

 

guima meu mestre guima

em mil perdões eu vos peço

por esta obra encarnada

na carne cabra da peste

da hygia ferreira bem casta

aqui nas bandas do leste

a fome de carne é madrasta

 

ave palavra profana

cabala que vos fazia

veredas em mais sagaranas

a morte em vidas severinas

tal qual antropofagia

teu grande serTão vou cumer


nem joão cabral severino

nem virgulino de matraca

nem meu padrinho de pia

me ensinou usar faca

ou da palavra o fazer

 

a ferramenta que afino

roubei do meste drummundo

que o diabo giramundo

é o narciso do meu Ser 


Artur Gomes

foto.poesia 

www.fulinaimagens.blogspot.com 





A flor da Pele

 

o mar lambeu o sal

das tuas coxas

 

https://www.facebook.com/cinevideocurtas/videos/501542120025851/?pnref=story




anda pelo ar

uma palavra interrogação

o que será?

 

o caranguejo

o beijo

objeto do desejo

linguagem movimento

 

ou será o éter pelo vento

escorrendo em minhas mãos?

 

onda que não cessa

nuvem cerebral espessa

depois do anoitecer 

sob um céu de capricórnio

extensa teia que aranha

nunca cessa de tecer

 

Federico Baudelaire

www.federicobaudelaire.blogspot.com



cena verbal 48
para D.

Dormes com a quietude
das laranjas,
com teus reinos
de hormônios e sementes.
Dormes para adoçar
abril, para
chover sobre o outono.
A carne febril
que sonegas ao pássaro
ferido, é teu realejo
secreto – donde
o impossível se esfarinha.
Agora, vem, despe
esse fruto
que doma os insanos;
que viceja os cegos
nas igrejas.
O tempo ausente está morto. Só
nos resta o agora em fatias. E
essa cadela rosnando
atrás do dia

Salgado Maranhão


PERSONAGEM SEM AUTOR
Um “não pisar a cena” dantesco
(Uma composição apenas.)

Quem quer sair de cena
não enfeita a ribalta,
não faz propaganda
nem improvisa caco.


Quem quer sair de cena
tira máscara e maquiagem,
Some calado, sem figurino,
abandona o palco e vai.

Quem quer sair de cena
não muda o cenário
nem troca a cortina
ou provoca a platéia.

Quem quer sair de cena
abandona o elenco
muda o roteiro
ignora os aplausos

e sai de cena.

 

Vera Sarres





Santo Guerreiro

a noite arma seu manto
como a geometria de um circo
a brisa esparrama seu canto.

No drama do palhaço profeta
o amor fez morada
no coração do poeta,

Sobre o peito uma flecha acesa
atinge o corpo da criatura
uma fábula de tristeza.

Porém enquanto existir saliva
rasgo as sombras da morte
e cravo as estacas da vida!

Sady Bianchin
do livro Tráficos Utópicos

"Sou um taquígrafo da minha mente. escrevo o que se passa
nela, não o que me circunda. sou um poeta”.  Allen Ginsberg 




da horta
March 01, 2018

gosto do amor que
quando não frenquenta mais
a cama, a mesa, a aorta
a gente não precisa
fechar a porta
e varrer o peito
limpando
mágoas, descasos, ausências

Esses que a gente pode deixar
a fresta sempre aberta
que tem sempre um sopro
de primavera
onde nascem espontaneamente

Clara Baccarin



Enquanto faço o verso, tu decerto vives.
Trabalhas tua riqueza, e eu trabalho o sangue.
Dirás que sangue é o não teres teu ouro
E o poeta te diz: compra o teu tempo.

Contempla o teu viver que corre, escuta
O teu ouro de dentro. É outro o amarelo que te falo.
Enquanto faço o verso, tu que não me lês
Sorris, se do meu verso ardente alguém te fala.

O ser poeta te sabe a ornamento, desconversas:
“Meu precioso tempo não pode ser perdido com os poetas”.
Irmão do meu momento: quando eu morrer
Uma coisa infinita também morre. É difícil dizê-lo:
MORRE O AMOR DE UM POETA.

E isso é tanto, que o teu ouro não compra,
E tão raro, que o mínimo pedaço, de tão vasto
Não cabe no meu canto.

Hilda Hilst 



Instruções de bordo
para você, A. C., temerosa, rosa, azul-celeste

Pirataria em pleno ar.
A faca nas costelas da aeromoça.
Flocos despencando pelos cantos dos
lábios e casquinhas que suguei atrás
da porta.

Ser a greta,
o garbo,
a eterna liu-chiang dos postais vermelhos.
Latejar os túneis lua azul celestial azul.
Degolar, atemorizar, apertar
o cinto o senso a mancha
roxa na coxa: calores lunares,
copas de champã, charutos úmidos de
licores chineses nas alturas.

Metálico torpor na barriga
da baleia.
Da cabine o profeta feio,
de bandeja.
Três misses sapatinho fino alto esmalte nau
dos insensatos supervoos
rasantes ao luar
despetaladamente
pelada
pedalar sem cócegas sem súcubos
incomparável poltrona reclinável.

Ana Cristina Cesar,
em “Poética”. São Paulo: Companhia das Letras, 2013. 



LAURA

O que fez
- flor inconclusa -
estiolar
inda menina
por sobre o abismo
do amanhã ?
Na memória do teu corpo
tua lida
pontas cruzes cicatrizes,
sei,
selaram tão breve vida.

A selva de cada esquina
dessa cidade cinzenta
deflorou tua inocência
te deixou chagas abertas
dor e pleno desamparo
no sol na chuva no frio,
sinal de trânsito fechado
no rito que não cumpriu
tua infância inexistente,
sei:
o quintal
o sorriso banguela
o pique a amarelinha
o amiguinho da escola
o remédio de vermes
a boneca de cachinhos
a família que era cuidado
a promessa de muito amor
o cobertor
nada disso aconteceu
a rua te negou
tua história desmentiu
a vida interrompeu.
Foste vítima
fotografia
escritura
baú de espantos:
fome doença pobreza
a cabeça, muita tonteira
- os últimos dias,
sem oratório,
sem beira,
ultrapassaram
o ponto a reta o limite
decidiram
curso e pouso
desse teu voo vertigem,
sei.

No chão do asfalto veloz
susto
o anjo te recolheu.

Nana, neném, nana
ao balanço do berço eterno.

Para onde foste,
projeto,
não sei.
Recado:
que te mandar deste mundo,
Laura,
a não ser que não é ninho ?

Álvaro Goulart 






Esse louco esforço
de ser sempre novidade
nos afunda pouco a pouco
nas areias da vaidade

Roger Willian
pintura by Magritte



Do filho malsucedido

há uma tristeza que não sai de mim
mesmo agora
segurando meu filho pela primeira vez
(foram os livros que me estragaram, reconheço)

um dia terei que dizer a essa criatura desagradável
se ela não morrer nos próximos dias
filho, não leia os livros que li
seja feliz

como essa gente que deixa a televisão ligada aos domingos
e nos dias úteis
engorda o câncer que cresce dentro de si

Rodrigo Novaes de Almeida



EU, PÁSSARO PRETO

eu,
pássaro preto,
cicatrizo
queimaduras de ferro em brasa,
fecho o corpo de escravo fugido
e
monto guarda
na porta dos quilombos.

Adão Ventura
do livro A Cor da Pele



Alucinações Interpo(É)ticas



o que é que mora em tua boca Bia?

um deus um anjo ou muitos dentes claros

como os olhos do diabo

e um a estrela como guia?

 

o que é que arde em tua boca Bia?

azeite sal pimenta e alho

réstias de cebola

um cheiro azedo de cozinha

tua boca é como a minha?

 

o que é que pulsa em tua boca Bia?

mar de eternas ondas

que covardes não navegam

rios de águas sujas

onde os peixes se apagam

ou um fogo cada vez mais Dante

como este em minha boca

de poeta delirante

nesta noite cada vez mais dia

em que acendo os meus infernos

em tua boca Bia?



ARTUR GOMES

https://www.facebook.com/cinevideocurtas/videos/419695281543869/?pnref=story



Artur Gomes - O Homem Com A Flor Na Boca

  metafórica dialética quantas teorias terei para escrever o que falo?   quantos sapatos ainda apertam os calcanhares do meu calo?...